El Niño intenso pode secar hidrelétricas do Nordeste e exigir mais térmicas

El Niño intenso pode secar hidrelétricas do Nordeste e exigir mais térmicas

A expectativa de um El Niño intenso nos próximos meses acende um sinal de alerta para as hidrelétricas do Nordeste do Brasil, com especialistas indicando que a situação dos reservatórios na região pode ficar crítica devido a uma tendência de menos chuvas entre outubro e abril.

A situação poderia exigir que termelétricas com energia mais cara, recentemente desligadas, sejam novamente colocadas em operação.

No limite, pode até haver dificuldades para o atendimento à demanda no horário de pico, afirmaram especialistas ouvidos pela Reuters.

O atual fenômeno climático El Niño deverá ganhar força antes do fim deste ano, atingindo um pico entre outubro e janeiro, disse a Organização Meteorológica Mundial (OMM) na semana passada, apontando que poderá ser uma das ocorrências mais fortes desde 1950.

“Para o Nordeste, eu diria que o senso comum é de que os anos de El Niño são mais propensos a secas do que anos sem o fenômeno”, afirmou o meteorologista sênior do serviço Point Carbon, da Thomson Reuters, Georg Müller.

Um El Niño de forte intensidade poderia reduzir as precipitações no período chuvoso do Nordeste necessárias para reabastecer hidrelétricas que atualmente contam com apenas 17 por cento de seus reservatórios.

“Os reservatórios já estão baixíssimos. Se a água não vier, estaremos muito mal”, disse a diretora da Engenho Consultoria, Leontina Pinto.

Ela chamou a atenção para a hidrelétrica de Sobradinho, que responde por quase 60 por cento da capacidade de armazenamento do Nordeste e hoje está com apenas 11 por cento do volume.

“A situação é apavorante, desesperadora. Passou do preocupante há muito tempo”, apontou Leontina, lembrando que as usinas não operam com níveis abaixo de 10 por cento da capacidade.

“A água do fundo do rio é lodo, tem muito detrito, lixo… não faz bem para as turbinas. Você pensa que tem (água) mas não tem.”

Para o diretor da associação de empresas de energia ABCE, Carlos Ribeiro, que já foi diretor de operação do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), caso o pior cenário se concretize no Nordeste, o ONS poderia negociar uma mudança na operação do sistema para manter o nível das hidrelétricas da região.

Isso envolveria a autorização de outros órgãos públicos, como a Agência Nacional de Águas (ANA), para, por exemplo, alterar a vazão e a disponibilidade de água no rio São Francisco.

SUDESTE

No Sudeste e no Centro-Oeste, onde estão as hidrelétricas com maiores reservatórios, o regime de chuvas de anos de El Niño não exerce influência clara para a recomposição dos reservatórios.

Para Ribeiro, da ABCE, será importante monitorar os efeitos do El Niño sobre o Sudeste para avaliar se medidas adicionais de segurança serão necessárias.

“Se os grandes reservatórios do Sudeste mantiverem a capacidade, é motivo de preocupação menor… mas se esse problema (de falta de chuvas causada pelo El Niño) se caracterizar nessa região, é um motivo de grande preocupação”, apontou.

TÉRMICAS

Por outro lado, o El Niño deve gerar maiores chuvas no Sul. Embora a região possua poucas hidrelétricas, seria possível enviar energia para o Sudeste, e dali apoiar o Nordeste, principalmente nos momentos de maior demanda, afirmou o presidente da comercializadora de energia Bolt, Érico Evaristo.

“No Nordeste temos geração térmica e eólica. A gente consegue atender (a carga). A grande questão é se vamos conseguir atender o horário de ponta”, ponderou Evaristo, que projeta um armazenamento médio “crítico”, de apenas 8 por cento, para os reservatórios da região em novembro.

O especialista em sistemas elétricos Marciano Morozowski, da WeeSee Consultoria, lembrou que a dificuldade de atendimento à ponta não é um problema novo.

Em janeiro deste ano, o ONS precisou pedir às distribuidoras que cortassem carga, provocando blecautes, devido à falta de geração para atender a demanda no horário de pico, por volta das 15h.

Morozowski prevê inclusive que pode ser necessário acionar novamente termelétricas que o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), órgão composto por autoridades do governo, autorizou que fossem desligadas no início de agosto.

O presidente da comercializadora de energia Comerc, Cristopher Vlavianos, também acredita que as térmicas podem ser novamente chamadas a operar, principalmente devido à tendência de as usinas eólicas, que hoje atendem quase um terço da demanda no Nordeste, produzirem menos na reta final do ano.

Ele destaca, no entanto, que a continuidade da retração na demanda, puxada pela fraqueza da economia e pelos altos custos da energia, poderia aliviar a situação, bem como uma eventual redução na intensidade do El Niño.

“Você tem um El Niño forte já verificado. Pode ser realmente um dos mais fortes registrados nos últimos 65 anos. Mas os efeitos meteorológicos são bastante voláteis… ele pode continuar forte ou mesmo começar a cair, entrar em um período neutro”, ressaltou.

As projeções do órgão divulgadas nesta sexta-feira apontam para reservatórios em 14 por cento no Nordeste ao final de setembro.

Reuters

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Redação

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