Abate de bois é ilegal em mais de 70% das cidades de Alagoas

Abate de bois é ilegal em mais de 70% das cidades de Alagoas

Ao rigor da lei, Alagoas é um “paraíso” do abate clandestino ou irregular de animais. Atualmente, mais de 70% dos municípios do Estado consomem carne de origem ilegal ou duvidosa, segundo estimativas oficiais.

Nos últimos três anos foram interditados dezenas de matadouros clandestinos em diversos municípios, incluindo um em Maceió. As interdições aumentaram a partir de atuações conjuntas da Agência de Defesa Agropecuária de Alagoas com a Superintendência Regional do Trabalho em 2013 e com o Ministério Público Estadual, a partir de 2009.

As interdições costumam aumentar em grandes operações, como a FPI (Fiscalização Preventiva Integrada) do São Francisco. Em suas três etapas a FPI fechou matadouros em Penedo, Igreja Nova, Girau do Ponciano e Batalha, entre outros.

Até 2013, segundo a Adeal, 19 dos 40 matadouros municipais existentes no estado tinham sido fechados. Desde então, outros três foram interditados – Girau do Ponciano, Palmeira dos Índios e Batalha. Esse  último no dia 22 de maio deste ano durante a FPI do São Francisco.

“Animais abatidos em desacordo com as normas de higiene sanitária, ambiente insalubre em função de materiais pérfuro-cortantes, vísceras tratadas no chão do estabelecimento. Esse foi o cenário encontrado pela Fiscalização Preventiva Integrada do São Francisco, na tarde desta sexta-feira (22), no matadouro do município de Batalha, Sertão de Alagoas. Em função de todas essas irregularidades, o matadouro foi interditado, a Prefeitura foi multada em quase R$ 250 mil e toda a carne foi apreendida”, registrou a assessoria do MPE-AL.

Não foi a primeira vez que o matadouro de Batalha foi interditado. Em 2012 uma operação da SRT e Adeal resultou no seu fechamento.

E depois, o que acontece?

Com base legal e normalmente lastreada em boas intenções, a interdição nem sempre dá os resultados esperados.

O presidente da Adeal reconhece que um dos efeitos colaterais é o aumento do abate clandestino de animais. “Infelizmente não temos como fiscalizar o abate clandestino”, admite.

Para driblar a fiscalização, marchantes de várias cidades passaram a entregar a carne (de animais abatidos clandestinamente) diretamente na casa do consumidor.

Outro problema é o aumento de custos por conta da logística e o desemprego que o fechamento dos matadouros provoca em algumas cidades.

O mais grave, no entanto, é a falta de opção do poder público.  O Estado (no seu sentido mais amplo) fecha, joga a chave fora e deixa para trás o problema. o abate que era irregular e podia ser melhorado, vira clandestino ou ilegal depois da interdição.

Sou capaz de imaginar que alguns prefeitos podem até “achar bom” o fechamento do matadouro – embora digam o contrário. É um problema e, principalmente, uma despesa, a menos para eles. Ou será que não?

É preciso avançar

Num ponto todos concordam: é preciso virar a página e trazer a cadeia produtiva da carne em Alagoas para o “século 21”. No interior do Estado ainda é comum o consumo da carne “quente”, prática que contraria toda e qualquer orientação de saúde humana ou animal.

O correto é adequar todo o processo às normas federais, melhorando as condições do abate, transporte e comercialização.

O problema é como fazer isso. O Estado não tem recursos, muito menos as prefeituras.

Atualmente  o que existe de “novo” nessa área é um processo de terceirização do matadouro de Arapiraca e a construção de um matadouro em Viçosa com recursos do governo estadual e federal (ainda como decorrência do Programa de Reconstrução da cheia de 2010). E só.

O secretário de Agricultura, Alvaro Vasconcelos, adianta que vai apresentar um projeto para construção de cinco matadouros escola ao Ministério da Ciência e Tecnologia, mas admite que por enquanto não há muito o que se fazer: “estamos conhecendo modelos de outros Estados e vamos trabalhar para adequar o abate de animais em Alagoas à legislação”, aponta.

O presidente da Adeal acredita que outra possibilidade seria a criação de consórcios de municípios para a manutenção de matadouros regionais. Mas ele não sabe em quanto tempo essa proposta pode virar realidade.

Na irregularidade

Enquanto as soluções não chegam, o alagoano vai continuar comendo carne de origem ilegal ou duvidosa. Um bom exemplo é o de Batalha. Depois do fechamento do matadouro na cidade, o abate foi transferido para Arapiraca (a 80 km), o que é ilegal, por falta do SIE. Além disso, a “logística” aumenta o custo, que começa a pesar no bolso do consumidor.

Nessa situação, revela um produtor da região, já tem marchante dando o “seu jeitinho”.

E se alguém quiser tirar a prova dos noves basta visitar os matadouros que operam em situação regular no estado. O número de animais abatidos não aumentou (há períodos até de queda no volume) desde que os matadouros foram interditados pela Adeal nas cidades do interior.

Assim é possível deduzir que ou aumentou o abate clandestino ou diminuiu o consumo de carne. O que você acha?

Apenas dois matadouros tem SIE

Em todo o Estado existem hoje apenas dois matadouros com registro no Serviço de Inspeção Estadual (SIE), da Agência de Defesa Agropecuária (Adeal) – o Mafrial, em Satuba e o Mafrips, em Rio Largo.

Nenhum estabelecimento alagoano tem o SIF (Federal) e outros dez  – segundo estimativas do presidente da Adeal, Marcelo Lima – tem o SIM (Municipal). Esse é o caso do matadouro de Arapiraca, segunda maior cidade de Alagoas.

A regra é simples: o SIM dá direito a circulação do produto de origem animal apenas no âmbito do próprio município. Para o abate e transporte entre cidades é preciso ter o SIE e entre os Estados, o SIF.

Um novo desafio

O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Luiz Dantas, está convocando os dirigentes de órgãos fiscalizadores para cobrar a formação de uma Força Tarefa para amparar produtores.

Diante da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI), envolvendo vários órgãos na autuação de fabriquetas de queijo, abate de animais e de outros micronegócios, Dantas entende que é urgente a construção de soluções. “Da mesma forma que há uma frente punitiva e de adequação, torna-se imperativa agora uma força-tarefa para proteger a economia familiar e centenas de empregos. Todos em busca de saídas”, conclamou o presidente do Legislativo.

Repressão só não funciona

A regra aqui é simples: a repressão sozinha não funciona.

Não adianta a Adeal, SRT, MPE ou qualquer órgão ou instituição fechar matadouro ou outro estabelecimento sem um trabalho de educação e envolvimento da comunidade.

O cidadão bem informado será sempre o melhor fiscal da lei. E ponto final.

 Edivaldo Junior

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